Em virtude da ampla variedade de tratamentos farmacológicos de transtornos mentais, é cada vez mais comum pacientes que procuram tratamento odontológico fazerem uso contínuo de psicofármacos. O número de pessoas que utilizam antidepressivos tem crescido, e isso exige dos cirurgiões-dentistas atualização a respeito da interação entre essa classe de medicamentos e os fármacos usados na clínica odontológica, como anestésicos locais e vasoconstritores. Objetivo: Efetuar uma revisão de literatura sobre o tema. Revisão de literatura e conclusão: Os dados sugerem que vasoconstritores simpatomiméticos (adrenalina, noradrenalina e fenilefrina) associados a anestésicos locais podem potencializar os efeitos colaterais dos antidepressivos, principalmente tricíclicos e inibidores da MAO, sobre o sistema cardiovascular. Porém poucos são os estudos clínicos e pré-clínicos sobre o assunto; na sua maioria foram realizados entre as décadas de 1960 e 1980. Pesquisas atuais são necessárias, já que muitas drogas antidepressivas novas, com diferentes mecanismos de ação, foram lançadas no mercado e estão sendo usadas atualmente. O avanço no desenvolvimento de fármacos, assim como na descoberta e no diagnóstico de patologias, faz com que um número considerável de pacientes que procuram tratamento odontológico esteja utilizando de forma contínua medicamentos, como por exemplo antidepressivos. Segundo o Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM IV),aproximadamente 10 a 25% das mulheres e 5 a 12% dos homens apresentam ao menos um episódio depressivo maior durante a vida. Percebe-se que a quantidade de usuários de antidepressivos é crescente, o que aumenta a probabilidade de o cirurgião-dentista atender pessoas que tomam tal tipo de medicação. Isso torna necessária a atualização desses profissionais a respeito da interação de fármacos, pois dados da literatura sugerem uma possível interação entre os vasoconstritores adicionados aos anestésicos locais com antidepressivos . Portanto, o objetivo deste trabalho foi fazer uma revisão da literatura, na qual foram abordados os aspectos gerais dos anestésicos locais empregados em odontologia, os antidepressivos, seus mecanismos de ação e a possível interação dos fármacos em questão. Anestésicos locais Anestésicos locais são bases fracas, pouco solúveis em água e instáveis na exposição ao ar, tendo pouco valor clínico. No entanto, quando essa base fraca é combinada com ácido, resulta na formação do sal anestésico, geralmente cloridrato, e assume assim uma característica mais hidrossolúvel e estável. Logo, os a nestésicos loca is usados para infiltração são encontrados na forma do sal anestésico dissolvido em água destilada ou soro fisiológico. No caso da combinação do anestésico com vasoconstritor, um antioxidante é adicionado, mais frequentemente o bissulfito de sódio, para retardar a oxidação do vasoconstritor, o que prolonga seu tempo de validade. O t ipo de a nestésico loca l ma is ut ilizado atualmente é o do grupo das amidas, por seu reduzido potencial alergênico, como a lidocaína, a prilocaína, a mepivacaína e a bupivacaína. O bloqueio da sensação dolorosa, proporcionado p elo u s o de a ne sté sico s lo c a i s, o cor re p elo impedimento da geração e da condução do impulso ner voso. Técnicas i n f i lt rat ivas e de bloqueio deposit a m o a nestésico loca l perto de f ibras nervosas, que são grupos de neurônios responsáveis pela transmissão da sensação de dor. Os anestésicos locais penetram na membrana dos axônios desses neurônios e impedem o início e a propagação dos potenciais de ação por meio do bloqueio dos canais de sódio operados por voltagem. Estes são responsáveis pela transmissão do potencial de ação. Com os canais de sódio bloqueados, a transmissão da sensação dolorosa também é inibida. Os anestésicos locais são bases fracas. Portanto, são bem absorvidos em condições fisiológicas normais, nas quais o pH fica em torno de 7,4. Porém, quando a região em que o anestésico será aplicado está inflamada, sua absorção é prejudicada, pois o pH da região estará baixo, fazendo com que a solução anestésica fique mais na sua forma ionizada, ou seja, com carga elétrica, o que dificulta o cruzamento da membrana celular, resultando em pouco ou nenhum efeito do anestésico. É possível que os anestésicos locais por si só também apresentem alguns efeitos adversos sobre o sistema nervoso central (SNC), primeiramente de ca ráter excitatório. Isso causa t remores e inquietação seguidos de uma depressão generalizada capaz de levar à morte por depressão respiratória. Efeitos adversos podem ser notados ainda sobre o sistema cardiovascular, como diminuição da excitabilidade elétrica e vasodilatação, provocando, respect iva mente, di m i nu ição dos batimentos cardíacos e hipotensão. Vasoconstritores A ma ioria dos sa is a nestésicos possu i a característica de provocar vasodilatação periférica, por relaxar a musculatura vascular. Desse modo, a adição de vasoconstritores aos anestésicos locais trouxe importantes vantagens, porque, como o próprio nome diz, eles fazem vasoconstrição no local em que são injetados. Tal fato reduz sua absorção sistêmica, prolongando o efeito do anestésico e tornando necessária a administração de uma quantidade menor deste, o que diminui o risco de toxicidade. Outra vantagem dos vasoconstritores é a hemostasia durante a realização de procedimentos invasivos, porém em regiões de circulação limitada a injeção de vasoconstritores pode causar hipoxia irreversível e necrose tecidual. Os agentes vasoconstritores mais comumente adicionados às soluções anestésicas em uso no Brasil são as aminas simpatomiméticas, como a adrenalina (epinefrina), a noradrenalina (norepinefrina), a levonordefrina e a fenilefrina. Outro vasoconstritor é a felipressina, um análogo sintético da vasopressina. Re s s a lt a- s e que a ad ren a l i n a t a mbém é empregada em Odontologia em fio para retração gengival e em soluções para controle de hemorragias, embora seja menos usual que em associação com os anestésicos locais. A s c a t e c o l a m i n a s a d r e n a l i n a ( A D ) e noradrenalina (NA), pertencentes ao grupo das aminas simpatomiméticas, são agentes endógenos produzidos no sistema nervoso central e pela medula da glândula suprarrenal e agem como neurotransmissores do sistema nervoso autônomo e do sistema nervoso central. Ambas, AD e NA, atuam em receptores adrenérgicos dos tipos α e β que participam da regulação da força e da frequência dos batimentos cardíacos, da pressão arterial, da dilatação dos brônquios, entre outros. Mas é o fato de causarem vasoconstrição quando se ligam aos receptores α1 da parede dos vasos sanguíneos e os ativam que as faz ser utilizadas como bons vasoconstritores [9, 18, 22]. A adrenalina apresenta menor toxicidade e um efeito mais rápido e mais curto que a noradrenalina, por ter mais afinidade pelo receptor α. A fenilefrina é um agonista seletivo dos receptores adrenérgicos α1, de modo a provocar vasoconstrição de forma semelhante à AD, e em virtude de sua maior estabilidade tem ação prolongada. A felipressina é um análogo sintético do hormônio vasopressina, também conhecido como hormônio antidiurético ou ADH, produzido pela neuro-hipófise. Esse hormônio participa da regulação da pressão arterial atuando basicamente em receptores V1 e V2. A felipressina opera em receptores V1, presentes na parede dos vasos sanguíneos, acarretando constrição dos vasos . Resu lt ados de ex peri mentos em anima is sugerem que seria possível que a combinação de AD e felipressina reduzisse os efeitos colaterais da AD sobre o coração, porém são encontrados estudos contraditórios a esse respeito na literatura. Apesar das vantagens dos vasoconstritores, a literatura alerta para alguns possíveis efeitos colaterais. Apesar de a quantidade presente em um tubete anestésico ser pequena, uma injeção intravascular acidental ou a administração em excesso pode ocasionar efeitos indesejáveis sobre o sistema cardiovascular e o sistema nervoso central. A fenilefrina, por ser um agonista α-adrenérgico seletivo, não causa estimulação cardíaca ou efeitos sobre o SNC como a A D, contudo é capa z de elevar a pressão arterial e, como consequência disso, diminuir a frequência cardíaca por período prolongado de tempo. A felipressina não acarreta danos ao sistema cardíaco como as catecolaminas, pois não atua nos receptores adrenérgicos, mas pode ter um efeito direto sobre o músculo cardíaco. Entretanto, como a quantidade usada para anestesia local odontológica é pequena, considera-se esse vasoconstritor seguro para pacientes cardiopatas. Em estudo clínico Cáceres et al. (2008) constataram ser possível aplicar com segurança a felipressina, em doses controladas, em pacientes com doença de Chagas ou com arritmias ventriculares. |